quinta-feira, 14 de junho de 2012

O grande tropeiro



Como toda história fantástica, a vida do mineiro Joaquim Rolla (1899-1972) começa de maneira improvável, tendo em vista os feitos de projeção internacional que lhe deram fama.

Desde a adolescência, em São Domingos do Prata (MG), demonstrou claramente tino para acumular dinheiro: enterrou moedas para “encontrá-las” depois e vendeu gasosa de abacaxi aos imigrantes que não toleravam a cachaça.

Já tropeiro, descobriu o poder multiplicador da jogatina em rodas de truco e, assim, seu destino foi selado.

Está tudo contado por João Perdigão, seu sobrinho-bisneto, e Euler Corradi no recém-lançado livro “O rei da roleta”.

Joaquim é um dos principais nomes da história do jogo no Brasil.

Num lance de cartas (literalmente), tornou-se dono do lendário Cassino da Urca, no Rio de Janeiro, o mais famoso do país e por onde passaram Carmen Miranda, Orson Welles, a alta sociedade, políticos e muito dinheiro.

Não bastasse, construiu o Quitandinha (aberto também como cassino, em Petrópolis), o Pavilhão de São Cristóvão (no Rio) e o Edifício JK (em Belo Horizonte), um dos maiores de Minas Gerais.

E ainda fez e administrou mais cassinos – incluindo o da Pampulha –, hotéis e estradas, além de ter fundado um jornal, a Folha da Noite Mineira.

Pelos shows e bancas de aposta das casas de Joaquim passou não apenas “gente famosa”, mas políticos, empresários e figuras que influenciavam diretamente o destino da nação.

Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek, Assis Chateaubriand, Roberto Marinho e o norte-americano Percival Farquhar (um dos principais investidores a atuar no Brasil no início do século 20) são apenas alguns exemplos.

Mas nem só de grandes empreendimentos vitoriosos é feita a carreira de Joaquim.

Sempre próximo ao poder, ele sentiu na pele o que significa contar com a simpatia e apoio de políticos.

Por um lado, recebeu das mãos de JK (assíduo frequentador dos cassinos cariocas) a concessão para explorar o Cassino da Pampulha (atual Museu de Arte).

Por outro, teve o Pavilhão São Cristóvão desapropriado pelo então governador da Guanabara Carlos Lacerda, que anulou os direitos de concessão conferidos a Joaquim por JK, seu adversário político.

Mais do que todo o dinheiro que Joaquim movimentou com seus negócios, o que mais impressiona nessa história é a capacidade que o empresário teve de se levantar depois de cada queda, principalmente depois da proibição ao jogo em todo o Brasil, feita em 1º de maio de 1946, pelo presidente Eurico Gaspar Dutra.

Os autores do livro estimam que, na época, havia 37 mil trabalhadores na indústria do jogo no país, 7 mil dos quais subordinados ao empresário mineiro.

O fato foi, talvez, o mais duro golpe para os negócios de Joaquim.


Inaugurado em 1944, o gigantesco Quitandinha teve, portanto, apenas cerca de dois anos para funcionar como cassino.

O investimento feito lá, de US$ 10 milhões em 1941, foi o motivo de ele não ter ficado pobre.

O terreno foi comprado por ele como uma fazenda afastada, cheia de pântanos.

Urbanizou tudo e, quando houve a proibição do jogo, ficou com uma dívida trabalhista enorme.

Vendendo os lotes, que ficaram valorizados, pagou tudo o que devia e ainda conseguiu fazer outros investimentos.

Foi quando migrou para a área imobiliária, com as construções do edifício JK, do Pavilhão São Cristóvão e do Hotel Venda Nova Paquequer.

Num almoço com o empresário, o urbanista Guilherme Vasconcellos comentou sobre a sua extraordinária ascensão, de tropeiro a miliardário.

Joaquim Rolla, com a fala amineirada que o acompanhou até o fim da vida, garantiu:

– Ganhar dinheiro foi a coisa mais fácil da vida. Difícil mesmo era trazer boi, burro e porco a pé, de Minas Gerais pro Rio de Janeiro, e fazer tudo chegar junto. Essa ninguém faz.

Um comentário:

  1. The Shadow Knows...Esses dias, assisti um filme que cita o Orson Welles fazendo esse personagem no rádio. O filme se chama "The Cradle Will Rock" e conta histórias sobre arte, teatro e paranóia anti-comunista na Nova Iorque do final dos anos 30.

    Muito bacana a resenha, obrigado! Agora, o urbanista ao qual você se refere, é o Marcos Vasconcelos. Mais informações sobre a pesquisa do Rolla em http://tropecassino.blogspot.com.br/

    Abrá!

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